Legalização do cânhamo no Brasil e no mundo

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O cânhamo é uma planta muito versátil e oferece vários benefícios ambientais, por isso, vem sendo considerada em regulamentações por países de diferentes continentes do mundo. Mas afinal, o cânhamo é permitido ou não no Brasil?

O cânhamo é uma variação da Cannabis sativa L. e está presente na humanidade há milhares de anos e, por isso, é tão importante entender a legalização do cânhamo ao redor do mundo. Apesar de não ser possível cravar uma data, estudos mostram que a planta era usada em objetos desde 10.000 a.C. na ilha de Taiwan, país ao leste da China – sua origem, portanto, muito provavelmente se deu na Ásia.  

Depois de séculos sendo utilizado de forma industrial, já que da sua estrutura é possível extrair diferentes matérias-primas e não causa efeitos psicotrópicos por conta do baixo nível de THC, o cânhamo passou a ser proibido em diferentes países, mas, ultimamente, sua regulamentação tem sido debatida em uma variedade de governos.

Mesmo com o proibicionismo da cannabis ao redor do mundo, muitos países nunca deixaram de cultivar e produzir o cânhamo por tradição e, também, por suas inúmeras finalidades e diversos de seus benefícios. O Brasil, apesar de ter seguido o movimento de proibição, também se apropriou das vantagens do cânhamo em certo momento da história em que implementou o plantio no país para ser usado na indústria têxtil – essas companhias brasileiras de produção têxtil à base de cânhamo, no entanto, começaram a ser fechadas e uma legislação incluiu a cannabis na lista de substâncias proibidas no país, em 1932. 

Mas afinal, o cânhamo é permitido no Brasil?

No Brasil, não há regulamentação que permita o cultivo de cânhamo. São poucas as formas, inclusive, de consumir qualquer derivado da cannabis e suas subespécies: via importação de medicamentos na Anvisa, por meio de associações, na compra limitada em farmácias e com a autorização de autocultivo (processo burocrático e desafiador para os pacientes terapêuticos). Aqui você pode ver alguns dos produtos à base de cannabis para fins medicinais disponíveis no mercado brasileiro. No entanto, é possível obter seus derivados em território nacional, e não só os medicamentos à base de CBD, como, por exemplo, tecidos feitos de suas fibras.

Isso acontece apesar da Anvisa ter afirmado, em 2021, que a importação desse material é proibida, já que o cânhamo é proveniente da Cannabis Sativa L., planta controlada e que precisa ser prescrita. Afinal, a Anvisa não é responsável por essa legislação e, sim, o MAPA (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento). Ainda, especialistas apontam que o tecido do cânhamo é um material processado e que não tem fitocanabinoides, não podendo ser categorizado como parte ou substância química da planta.

Assim, pode-se dizer que a regulamentação em torno do cânhamo está em um limbo, principalmente em relação aos tecidos provenientes de suas fibras. Um exemplo são os registros nacionais que comprovam a importação de insumos do cânhamo por parte de estados brasileiros – segundo o Comércio Exterior Brasileiro (Comex Stat), nos anos de 2007 e 2008, o estado de São Paulo importou de Bangladesh mais de 100 toneladas de cânhamo bruto. Hoje, essas importações ainda são uma realidade: diversas marcas lançam coleções com roupas feitas com fibras de cânhamo e não são criminalizadas, como é o caso da Osklen, Reserva e Ginger

Por outro lado, a importação de sementes de cânhamo é ilegal, porque poderia configurar tentativa de cultivo – prática ainda não regulamentada. 

Esse cenário, porém, pode mudar nos próximos anos. Existem projetos de lei que têm como objetivo discutir e regulamentar esse cultivo, como o PL 399/2015, em que se definiu que o cânhamo industrial teria teor máximo de 0,3% de THC. A proposta ainda determina que a planta poderia ser cultivada em ambiente aberto (outdoor) e seria utilizada para a produção de cosméticos, produtos de higiene pessoal, celulose, fibras, produtos de uso veterinário sem fins medicinais, alimentos, suplementos alimentares e mais. 

A legalização dos de derivados do cânhamo no Brasil

Mas como que algumas lojas brasileiras vendem roupas com tecidos derivados do cânhamo, por exemplo? Em 2021, a Anvisa afirmou que a importação desse material é proibida, já que o cânhamo é proveniente da Cannabis Sativa L., planta controlada e que precisa ser prescrita.

Em março de 2022, a Kaya Mind lançou o seu primeiro relatório completo sobre o cânhamo, suas principais finalidades, seus benefícios, desafios e potenciais no Brasil. A partir desse material, é possível entender um cenário amplo sobre a planta no país e no mundo. 

Assim, pode-se dizer que a legalização em torno do cânhamo está em um limbo, principalmente em relação aos tecidos provenientes de suas fibras. Por isso, diversas marcas continuam e continuarão lançando coleções com roupas feitas com fibras de cânhamo e não serão criminalizadas.

Por outro lado, a importação de sementes de cânhamo é ilegal, pois não é permitido cultivar a planta no Brasil. As sementes de cânhamo, no entanto, também podem ser utilizadas para a produção de outras matérias-primas, como óleos, leites, proteína em pó e até mesmo consumidas in natura na alimentação, pois são consideradas superalimentos e carregam diversos nutrientes importantes para o organismo.

A partir de novas pesquisas sobre a Cannabis Sativa L., compreende-se, cada vez mais, que o cânhamo é uma subespécie com potenciais industriais ainda imensuráveis. Alguns países, portanto, já vem mudando sua regulamentação e autorizando o seu cultivo; os Estados Unidos, com a Farm Bill (lei agrícola) de 2018, foram um deles, mas nações como a China, Letônia, França, Alemanha e muitas outras já têm extensas plantações dedicadas a esse cultivar. Assim, atuam em indústrias diversas, como a farmacêutica, a de bebidas, alimentos, têxtil, automotiva, cuidados pessoais etc.

Legalização do cânhamo no Brasil e no mundo
Legalização do Cânhamo ao redor do mundo

Quais países regulamentaram o cânhamo?

Já são muitos os países de diferentes continentes que regulamentaram o cânhamo e estão se beneficiando de suas qualidades. Cada um tem suas legislações, com o cultivo para finalidades específicas e o limite de THC das plantas delimitado. Veja quais são eles: 

Alemanha 

  • Tipo de regulamentação: cultivo legalizado quando são sementes certificadas e autorizadas, alguns produtos industriais podem ser vendidos no país.  
  • Limite de THC: 0,2%
  • Área agricultável: 4508 hectares (2019)

Argentina

  • Tipo de regulamentação: permitido para fins medicinais e industriais. 
  • Limite de THC: 1% (aguardando confirmação pela nova regulamentação)
  • Área agricultável: 35 hectares (2020)

Austrália

  • Tipo de regulamentação: permitido para fins medicinais e industriais. 
  • Limite de THC: 1%, variando conforme a província
  • Zona: Temperada/Intertropical
  • Área agricultável: 2.500 hectares (2020)
  • Participação do cânhamo no total agricultável: 0,007%

China

  • Tipo de regulamentação: permitido para fins industriais, produção de CBD somente para exportação
  • Limite de THC: 0,3%
  • Zona: Temperada/Intertropical
  • Área cultivada: 407.267 hectares (2019)
  • Participação do cânhamo no total agricultável: 0,25%

Colômbia

  • Tipo de regulamentação: permitido para fins medicinais e industriais. 
  • Limite de THC: 1% 
  • Zona: Intertropical
  • Área agricultável: 45 hectares
  • Participação do cânhamo no total agricultável: 0,00009%

Espanha

  • Tipo de regulamentação: Cultivo legalizado para fins industriais.  
  • Limite de THC: 0,2%
  • Área agricultável: 130 hectares (2018)

EUA

  • Tipo de regulamentação: Em 2018, a Farm Bill foi atualizada e o cultivo de cânhamo foi permitido a nível federal. Essa foi uma conquista importante para os Estados Unidos, que ainda não regulamentaram o uso medicinal e nem recreativo – apenas alguns estados o fizeram. 
  • Limite de THC: 0,3%
  • Zona: Temperada/Polar
  • Área cultivada: 27.593 hectares (2020)
  • Participação do cânhamo no total agricultável: 0,02%

França

  • Tipo de regulamentação: cultivo para fins medicinais e industriais legalizado. 
  • Limite de THC: 0,3%
  • Zona: Temperada
  • Área cultivada: 14.550 hectares (2019)
  • Participação do cânhamo no total agricultável: 0,05%

Holanda

  • Tipo de regulamentação: cultivo regulamentado, com limite de THC de 0,5%.  
  • Limite de THC: 0,5%
  • Zona: Temperada
  • Área agricultável: 3.833 hectares (2020)
  • Participação do cânhamo no total agricultável: 0,2%

Inglaterra

  • Tipo de regulamentação: cultivo legalizado, mas com licenças autorizadas. 
  • Limite de THC: 0,2%
  • Área agricultável: 800 hectares (2022)

Letônia

  • Tipo de regulamentação: permitido para fins industriais
  • Limite de THC: 0,2%
  • Área agricultável:  1000 hectares (2017)

Lituânia

  • Tipo de regulamentação: permitido para fins medicinais e industriais.
  • Limite de THC: 0,3%
  • Zona: Temperada
  • Área agricultável: 9.000 hectares (2019)
  • Participação do cânhamo no total agricultável: 0,3%

Paraguai

  • Tipo de regulamentação: cultivo e produção permitidos. É a terceira maior potência industrial de cânhamo no mundo e o maior produtor e exportador da planta e seus derivados da América Latina.
  • Limite de THC: 0,5%
  • Área agricultável: + 5.000 hectares 

Portugal

  • Tipo de regulamentação: cultivo regulamentado para fins industriais, como para obtenção de fibras, sementes etc.
  • Limite de THC: 0,2%
  • Área agricultável:  3 hectares (2018)

Tailândia

  • Tipo de regulamentação: cultivo, comercialização e uso de produtos derivados do cânhamo são permitidos sem licença, a não ser que contenham mais de 0,2% de THC.
  • Limite de THC: 0,2%
  • Área agricultável: 100 hectares (2020)

Uruguai 

  • Tipo de regulamentação: cultivo, uso e exportação permitidos.
  • Limite de THC: 1%
  • Zona: Temperada
  • Área agricultável: 456 hectares (2021)
  • Participação do cânhamo no total agricultável: 0,003%

THC: o que é e sua relação com o cânhamo

limites de thc do cânhamo

O THC, junto com o CBD, é o fitocanabinoide mais abundante na cannabis. Ele é principalmente conhecido por causar efeitos psicotrópicos, isto é, deixar “chapado”, mas também oferece propriedades medicinais importantes, em especial quando age conjuntamente com outros princípios ativos da cannabis no organismo, causando o que se chama de efeito entourage ou efeito de comitiva.

No cânhamo, no entanto, não há uma quantidade relevante de THC, o que impede essa planta de ser utilizada para fins recreativos. Ainda assim, muitos países controlam esse nível e desejam atingir o menor deles possível, pois investem mais no CBD como propriedade medicinal, até porque esse fitocanabinoide não causa efeitos psicotrópicos e há menos preconceito em torno dele.

O que influencia os limites de THC do cânhamo?

Os métodos e áreas de cultivo influenciam na quantidade de THC que é produzida pela planta. Quando há uma alta incidência de luz solar na planta, o fitocanabinoide THCA (forma química anterior ao THC) passa pelo processo de descarboxilação (calor, oxidação ou luz) e cria maiores quantidades de THC. Isso significa que, quanto mais frio for o território em que ocorre o cultivo, mais simples é controlar o THC e, portanto, obtém-se níveis mais baixos.

A partir de uma pesquisa da Kaya Mind, viu-se que os limites mais baixos de THC são referentes à países em zonas temperadas e polares, enquanto os limites mais altos, às zonas intertropicais. No Brasil, onde o clima é tropical, caso houvesse uma regulamentação do cultivo de cânhamo com baixo limite de THC, as sementes da planta precisariam ser selecionadas estrategicamente, já que os perfis canabinoides são variados, e, possivelmente, precisariam ser até adaptadas ao território nacional. Ainda, possivelmente poderia haver perdas significativas de colheitas que ultrapassassem esse limite baixo e não pudessem comercializar seu produto.

Vale citar que esses dados foram compostos pela Kaya Mind a partir de uma pesquisa em outubro de 2021, o que significa uma possível atualização dessas informações nos últimos meses.

Para conhecer a zona, limite de THC e áreas cultivadas de cânhamo em outros países de forma mais detalhada, acesse o relatório gratuito “Cânhamo no Brasil”, lançado em março de 2022.

Referências:

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