O cenário da cannabis no Brasil ainda caminha de forma gradual — e quem dita o ritmo desse avanço é, principalmente, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Embora a planta tenha um longo histórico de uso terapêutico em diferentes culturas, aqui no país o debate regulatório é relativamente novo e permeado por cautela, debates técnicos e, muitas vezes, também por resistências culturais. Então, qual a relação entre Anvisa e cannabis medicinal?
Nos últimos anos, a Anvisa deu sinais importantes de abertura em relação ao tema, mas o processo ainda é cheio de nuances. Afinal, a agência reguladora é responsável por zelar pela saúde pública e precisa equilibrar segurança científica, inovação e demandas sociais em um setor que carrega estigmas históricos.
Se você quer entender de forma clara e atualizada como a Anvisa enxerga a cannabis medicinal — e o que está em jogo nas discussões atuais —, vem com a gente!
Anvisa e cannabis medicinal no cenário atual

Desde 2015, quando a Anvisa autorizou a importação de produtos à base de cannabis para uso medicinal mediante prescrição médica, o cenário regulatório brasileiro mudou bastante. De lá para cá, o país passou a permitir a venda de produtos de cannabis em farmácias, a normatizar critérios de qualidade e, mais recentemente, a discutir ajustes mais profundos nessas regras.
Em 2019, a publicação da RDC 327 foi um marco. Essa resolução criou o regramento para a fabricação, importação, comercialização, prescrição e dispensação de produtos de cannabis para fins medicinais. Foi a primeira vez que se desenhou um caminho mais estruturado para pacientes e empresas interessadas nesse mercado.
Mas a história não parou aí. Em 2025, a Anvisa abriu uma Consulta Pública para atualizar a RDC 327. O objetivo? Modernizar as exigências de qualidade, estabelecer categorias de produtos (com ou sem canabinoides), reforçar regras para novos tipos de fórmulas (como óleos, cápsulas e cosméticos), e também revisar as exigências para garantir segurança e eficácia.
Entre os principais pontos em discussão, estão:
- A definição de categorias específicas de produtos, separando produtos com THC, CBD e outros canabinoides;
- A possibilidade de ampliar a venda nas farmácias, mas com novas exigências de qualidade técnica;
- A limitação de importação de produtos que não cumpram padrões elevados, privilegiando produtos com registro no Brasil.
Essas atualizações mostram que a Anvisa reconhece o avanço científico sobre a cannabis e o crescimento do mercado, mas ainda atua de forma bastante conservadora em comparação a países como Alemanha, Canadá e Austrália, onde a flexibilização foi mais ampla e estratégica.
Qual é a regulamentação da Anvisa para cannabis no Brasil?
Para entender a atuação da Anvisa, é importante conhecer o que já está regulamentado hoje. De maneira simplificada:
- Produtos de cannabis podem ser vendidos em farmácias desde que tenham autorização sanitária específica, concedida pela Anvisa. Esses produtos não são considerados medicamentos convencionais (não têm registro simplificado) e, por isso, devem apresentar estudos de qualidade, segurança e eficácia.
- Prescrição médica obrigatória, com receituário controlado (tipo B ou especial), é necessária para aquisição dos produtos.
- Importação pessoal ainda é permitida, especialmente para produtos com concentração de THC superior a 0,2%, mediante autorização individual emitida pela Anvisa.
- Cultivo para uso pessoal ou empresarial continua proibido. Empresas e pacientes não podem plantar cannabis em território nacional — o que gera um mercado 100% dependente da importação de matéria-prima ou produtos acabados.
O que está em pauta atualmente é a revisão dessa lógica. Além da revisão da RDC 327, a Anvisa também discute, junto à União e outros órgãos, a possibilidade de regulamentar o cultivo de cannabis para fins medicinais e industriais — o que seria um salto importante para autonomia e barateamento do acesso.
Se essas mudanças avançarem, abre-se a porta para:
- Produção nacional de insumos farmacêuticos ativos (IFAs);
- Maior controle de qualidade no território nacional;
- Acesso a produtos mais baratos para a população;
- Geração de empregos e desenvolvimento de novos setores produtivos.
Hoje, o Brasil já movimenta cerca de R$ 850 milhões por ano apenas com a cannabis medicinal, segundo o Anuário da Cannabis Medicinal 2024, e a expectativa é que esse número cresça de forma expressiva com um marco regulatório mais moderno.
No Brasil, a agência prioriza um modelo restritivo, onde a venda está condicionada à prescrição médica individual, à análise rigorosa de produtos e ao controle sanitário rígido.
O equilíbrio entre cautela e oportunidade
A postura da Anvisa, mesmo que prudente, carrega uma lógica compreensível: garantir que o acesso à cannabis medicinal aconteça com segurança para a população. A agência defende que todo produto disponível no país cumpra critérios mínimos de eficácia, qualidade e segurança — como acontece com qualquer substância farmacêutica.
Por outro lado, há quem critique a lentidão do processo regulatório e o excesso de burocracia. Como destacou o professor Jean Marcel Carvalho, da Unesp, em entrevista recente, o debate sobre cannabis medicinal no Brasil ainda é contaminado por preconceitos e falta de objetividade, o que atrasa avanços científicos e práticos.
Enquanto isso, países como Canadá e Alemanha mostraram que políticas públicas que incentivam a pesquisa e a regulamentação bem desenhada podem ampliar o acesso, impulsionar a economia e estimular novos tratamentos de forma segura.
O Brasil já tem uma base sólida de evidências científicas — mas poderia avançar ainda mais com:
- Incentivo à pesquisa acadêmica;
- Campanhas de educação pública sobre cannabis medicinal;
- Políticas públicas focadas na capacitação de médicos e farmacêuticos;
- Regulação de cultivo nacional com controle e rastreabilidade.
Vale lembrar: já são mais de 670 mil pacientes brasileiros utilizando cannabis medicinal, com 18 mil médicos prescritores. A demanda é real — e crescente.
Como ter acesso à cannabis medicinal na Anvisa?
Para ter acesso aos medicamentos derivados da cannabis, é necessário seguir um processo específico para estar de acordo com a regulamentação e iniciar um tratamento correto para o seu tipo de condição.
Consulte um médico
De acordo com os dados coletados, são poucos os profissionais aptos e dedicados a prescrever produtos à base de maconha. Ainda assim, é muito importante realizar uma consulta com esses especialistas, pois são eles que fazem a avaliação correta e dão orientações específicas de como deve ser o tratamento. Além disso, eles escrevem as receitas necessárias para comprar a medicação ou realizar a solicitação de importação para a Anvisa. Solicite à Anvisa
Caso os medicamentos prescritos pelo médico não sejam vendidos no Brasil, é necessário entrar com um pedido de importação à agência reguladora. Isso deve ser realizado por meio do Portal do Cidadão e são solicitados três documentos:
- Receita do produto;
- RG e CPF.
- Comprovante de residência.
A autorização dura dois anos, e a quantidade e a marca do produto são definidas pela prescrição médica.
Compre o produto
Quando o processo, que demora de sete a 30 dias, for liberado, será possível fazer a compra do medicamento legalmente, seja de forma presencial ou online.
Existe também a possibilidade de ter acesso aos produtos a partir de associações que receberam autorização para cultivar, fabricar e comercializar os medicamentos à base de cannabis no Brasil. Essa alternativa é uma forma de baratear o custo, já que a importação exige um gasto financeiro alto, inacessível para muitos.
O auto cultivo também é uma opção mais barata, apesar de ser um processo mais complexo de obter liberação legal. É necessário entrar em contato com um advogado, verificar se todas as suas condições são aptas e, então, impetrar um habeas corpus para conseguir essa autorização.
O que esperar do futuro próximo entre Anvisa e cannabis medicinal?
A tendência é de abertura gradual, mas com muita cautela. O movimento de revisão da RDC 327 e as discussões sobre cultivo são passos importantes. A expectativa é que, ao longo dos próximos anos:
- Mais produtos à base de cannabis aprovados para venda no Brasil;
- Possível autorização para cultivo medicinal nacional (sob controle rígido);
- Novos tipos de produtos (tópicos, cosméticos, suplementos) entrando no mercado;
- Maior integração entre pesquisas clínicas nacionais e a regulação de produtos.

Se a Anvisa conseguir equilibrar segurança com inovação, o Brasil tem tudo para se tornar uma referência em cannabis medicinal na América Latina — fomentando saúde pública, desenvolvimento científico e oportunidades econômicas.
A relação entre a Anvisa e a cannabis medicinal é de avanços cautelosos. A agência reconhece o potencial terapêutico da planta, mas prioriza evidências científicas robustas antes de ampliar o acesso e a produção nacional.
Aos profissionais de saúde, empreendedores e pacientes, o momento pede atenção, estudo e engajamento. Com informação qualificada e participação ativa no debate público, podemos acelerar a transformação do mercado da cannabis no Brasil — de forma ética, segura e sustentável.
Quer entender ainda mais sobre o mercado de cannabis medicinal no Brasil? Acesse o Anuário da Cannabis Medicinal 2024 da Kaya e tenha acesso aos dados mais atualizados sobre pacientes, médicos, associações, produtos e tendências!


