A partir desta segunda-feira (30), tem início em todo o país o I Mutirão Processual Penal do plano Pena Justa, coordenado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Entre os focos principais da ação está a revisão de condenações relacionadas ao porte de maconha para uso pessoal, conforme a decisão recente do Supremo Tribunal Federal (STF) que descriminalizou o porte de pequenas quantidades da planta.
A revisão vai até o dia 30 de julho e envolve todos os Tribunais de Justiça Estaduais e Tribunais Regionais Federais, com apoio técnico do programa Fazendo Justiça. A expectativa é que o esforço corrija condenações indevidas e atualize a jurisprudência à luz das novas diretrizes do STF.

Entenda a decisão do STF e o que será revisado
No ano passado, o STF afastou o enquadramento criminal do porte de maconha para consumo pessoal. Na prática, isso significa que pessoas flagradas com até 40 gramas ou até 6 pés de cannabis devem ser avaliadas sob uma nova ótica: a do consumo pessoal, e não mais como tráfico.
Para garantir que essa decisão seja implementada de forma correta, o CNJ convocou o mutirão e criou uma metodologia especial de pré-seleção dos casos — já que os sistemas eletrônicos nacionais não permitem, por si só, filtrar todos os processos que se enquadram nas novas regras. Em muitos estados, a seleção vem sendo feita com apoio de inteligência artificial e bancos de sentença.
Entre os critérios que devem ser observados:
- Quantidade inferior a 40 gramas ou até 6 plantas;
- Ausência de outras drogas no flagrante;
- Ausência de indícios de tráfico (como balança, dinheiro fracionado ou caderno de anotações).
Você sabe a diferença entre legalização e descriminalização, nesse artigo te explicamos tudo!
Quatro possíveis desfechos para os processos
Cada caso será analisado individualmente, e os encaminhamentos possíveis são:
- Manutenção da pena, quando os critérios do STF não forem atendidos.
- Cancelamento da condenação, quando se tratar apenas de porte pessoal (Art. 28).
- Revisão da condenação por tráfico, para reclassificação conforme a nova jurisprudência.
- Encaminhamento para manifestação da defesa e do Ministério Público, quando houver necessidade de avaliação mais aprofundada.
Outros temas também serão avaliados no mutirão
Apesar do foco na cannabis, o mutirão também contempla:
- Substituição da prisão preventiva por domiciliar para gestantes, mães de crianças menores de 12 anos ou responsáveis por pessoas com deficiência (decisão do STF de 2018 – HC 143641);
- Prorrogação indevida de prisões preventivas em curso há mais de um ano;
- Processos com penas vencidas ou prescritas no Sistema SEEU.
Esses casos fazem parte da estratégia de redução do encarceramento em massa e revisão de prisões que não se sustentam mais à luz da Constituição e dos direitos humanos.
Cronograma e próximos passos
Os preparativos começaram ainda em maio, com a extração de listas dos sistemas SEEU e BNMP 3.0. Em junho, foi publicada a Portaria CNJ nº 167/2025 com regras oficiais do mutirão. No dia 26, os tribunais enviaram um primeiro levantamento preliminar.
A execução do mutirão vai de 30 de junho a 30 de julho, com a segunda etapa de respostas prevista para 9 de agosto. A produção dos relatórios ocorre em setembro, e os resultados serão divulgados em outubro.
Por que essa revisão é importante?

O Brasil ainda prende milhares de pessoas por crimes ligados à Lei de Drogas, uma legislação ambígua que deixa margem para interpretações subjetivas. Dados do Infopen mostram que quase 1 em cada 3 pessoas presas por tráfico foi detida com pequenas quantidades — muitas vezes enquadradas injustamente.
Com a decisão do STF e a mobilização do CNJ, espera-se que parte dessas prisões seja revista, promovendo mais justiça, proporcionalidade e racionalidade na política penal brasileira.
Se você tem curiosidade em saber a quantas anda a possível regulamentação da cannabis no Brasil, não deixe de conferir nosso artigo sobre os projetos de lei que estão em tramitação no país.
E o que isso tem a ver com cannabis medicinal?
Apesar de o foco do mutirão estar no uso recreativo, essa movimentação também ajuda a tirar o tema da cannabis da marginalidade e abrir caminhos para uma regulamentação mais ampla, inclusiva e baseada em evidências científicas.
Quer entender mais sobre os impactos da proibição e da regulamentação no Brasil? Leia também: Proibicionismo – como tudo começou e o que mudou até hoje
Acompanhe o blog da Kaya Mind para ficar por dentro das principais decisões sobre cannabis no Brasil — da justiça à saúde pública.