O químico israelense Raphael Mechoulam é considerado o pai da cannabis, pois ele quem identificou o sistema endocanabinoide e, por consequência, entendeu a atuação medicinal que a cannabis e seus fitocanabinoides teriam no corpo humano. Hoje, a comunidade científica busca incessantemente por mais informações sobre o efeito terapêutico da cannabis e como ela poderia tratar diversas condições médicas, como câncer, doença de Parkinson, doença de Alzheimer, depressão, glaucoma e mais. Para explorar de forma mais aprofundada os benefícios e riscos do uso medicinal da planta em relação ao tratamento de certas doenças, a Kaya Mind iniciou uma série sobre o assunto. Neste texto, será abordada a doença de Alzheimer.
A doença de Alzheimer
A doença de Alzheimer é uma doença neurodegenerativa responsável pela demência e a mais comum do mundo, acometendo mais de 35 milhões de pessoas, em especial a população acima de 65 anos. É uma condição complexa de ser diagnosticada, pois muitos sintomas se assemelham àqueles que surgem com o envelhecimento (perda de memória, raciocínio mais lento etc.) e, ainda, difícil de tratar, pois muitos medicamentos comumente utilizados causam efeitos colaterais e não evitam ou retardam a sua progressão.
Além dos sintomas neurológicos, segundo um estudo publicado na Frontiers in Pharmacology, publicação de extrema relevância internacional, muitas vezes os pacientes diagnosticados com a doença de Alzheimer também relatam dores moderadas a intensas. Contudo, devido ao desenvolvimento de disfunções cognitivas, têm dificuldades de expressar que estão sentindo dor, bem como não há tratamento eficaz para a atenuação dos sintomas. Isso, no entanto, vem mudando e a cada dia aumenta o número de pesquisas que buscam novas alternativas para tratar ou prevenir o processo da doença. A cannabis, por exemplo, vem se mostrando promissora.
Cannabis e Alzheimer
Enquanto a doença de Alzheimer é ocasionada por uma neurotoxicidade que prejudica a atividade dos neurônios e, assim, leva à morte neural e a neurodegeneração, os dois principais fitocanabinoides da cannabis, CBD e THC, têm papéis neuroprotetores, anti-inflamatórios e estimulam a neurogênese. Esse fato se dá, pois, ao entrar em contato com o corpo humano, o sistema endocanabinoide é ativado, o qual é responsável por diversas funções importantes no sistema nervoso.
A cannabis não só consegue prevenir ou retardar essa condição médica, como tratar os seus sintomas. O CBD, por exemplo, é conhecido por suas propriedades ansiolíticas e analgésicas, algo muito relevante para um paciente acometido pela doença de Alzheimer porque costuma sofrer com agitação, ansiedade, agressividade e dor. O THC, além de ter propriedades em comum com o CBD, tem eficácia contra a depressão e estimula o apetite, condições que também afetam aqueles acometidos com a doença.
Há poucas evidências em relação à eficácia de outros fitocanabinoides da planta no tratamento da doença de Alzheimer, pois ainda não são compostos químicos tão conhecidos quanto o THC e o CBD. Isso, no entanto, deve mudar, conforme novos estudos vão surgindo.
Fitocanabinoides e a dor
Ainda de acordo com a mesma pesquisa publicada na Frontiers citada anteriormente, os receptores da cannabis são encontrados em diversas partes do corpo humano, incluindo, mas não limitado às células do sistema imunológico. Estas podem ter um papel importante no controle da dor, pois são parte do sistema endocanabinoide, que está relacionado ao processo de homeostase do corpo, trabalhando em conjunto com outros órgãos para devolver o equilíbrio aos pacientes que sofrem com alguma disfunção.
O que os pesquisadores observaram foi: “embora os canabinóides endógenos possam ser necessários para a regulação homeostática da dor, os canabinóides exógenos, incluindo canabinóides sintéticos e THC, podem ser uma terapia adjuvante promissora para o tratamento da dor clínica.”
Pesquisas e casos reais da cannabis e doença de Alzheimer
As pesquisas já existentes referentes às vantagens do uso do THC e o CBD para tratar a doença de Alzheimer ainda não são consolidadas, apesar de muitos pacientes já mostrarem uma melhora dos sintomas a partir desse consumo. Ivo Suzin, diagnosticado com a condição médica aos 52 anos, recebeu tratamento à base de maconha por meio de uma iniciativa de seu filho, Filipe, e, hoje, tem uma qualidade de vida muito melhor. A família, inclusive, impetrou um habeas corpus para ter autorização da justiça para cultivarem a planta e continuarem com o tratamento. Assim, surgiu a associação “Curando Ivo”, que luta pelo acesso democrático do uso medicinal da cannabis e conscientiza sobre seus benefícios.
A sociedade, no entanto, deve cada vez mais se basear em pesquisas acadêmicas, afinal, o número só cresce. A partir do Kaya Board, a plataforma de inteligência de dados da Kaya Mind, é possível acompanhar a evolução nas pesquisas acadêmicas e observar quais são os temas que estão mais em alta. Nos últimos anos o número de pesquisas vem crescendo exponencialmente: entre 2021 e 2020, o aumento foi de 17% mesmo em meio a pandemia e o tema da neurociência segue sendo o principal assunto explorado devido à quantidade de pacientes acometidos com doenças neurodegenerativas no mundo.
Vale lembrar que é importante buscar ajuda e ter acompanhamento profissional para entender qual o tratamento mais adequado para cada pessoa e condição médica.