A ataxia se refere a um grupo de sintomas caracterizado por comprometimento da coordenação motora causada por disfunções no sistema nervoso, mais especificamente no cerebelo, que é a área do cérebro responsável pelo controle motor e pela coordenação dos movimentos. Nesse texto, vamos compreender quais são as causas da ataxia, como é feito o diagnóstico, as diferentes categorias de sintomas e o tratamento da condição.
O que é ataxia?
A ataxia é essencialmente caracterizada pela perda de coordenação nos movimentos voluntários, sendo um sintoma integrante do espectro clínico de várias desordens neurológicas.
Os movimentos voluntários consistem em ações que são planejadas e executadas de maneira consciente e organizada, e envolvem a transmissão de estímulos sensoriais para o cérebro. Por exemplo, a coordenação necessária para pegar objetos, escrever ou realizar atividades motoras específicas está intrinsecamente ligada a esse sistema de movimentos controlados.
A ataxia compromete a coordenação dos movimentos e podem ser indicativos de várias condições médicas ou neurológicas degenerativas que afetam o sistema nervoso. Essas condições impactam os movimentos em diversas regiões do corpo, incluindo dedos, mãos, braços, pernas e olhos, assim como o equilíbrio, o tônus muscular, a deglutição e a fala.
Os sintomas da ataxia podem incluir dificuldade em caminhar, movimentos comprometidos, ausência de equilíbrio, tremores e dificuldades na fala.
Tipos de ataxia
Há diferentes tipos de ataxia, e suas causas podem ser diversas. Alguns dos tipos mais comuns incluem a ataxia cerebelar, que é associada a problemas no cerebelo, e a ataxia sensorial, que envolve a incapacidade do sistema nervoso em integrar informações sensoriais para coordenar os movimentos. Abaixo vamos descrever cada um deles:
Ataxia Cerebelar Espinocerebral
As ataxias espinocerebelares (SCAs) representam um conjunto de condições genéticas neurodegenerativas, geralmente de início tardio, apresentando ampla variabilidade clínica. Elas se caracterizam pela perda gradual da coordenação na locomoção. As causas muitas vezes são genéticas e representadas pelas disfunções entre pare do cérebro.
Ataxia de Friedreich
A ataxia de Friedreich é uma condição resultante de uma alteração genética que leva o organismo a produzir quantidades reduzidas de uma proteína denominada frataxina, essencial para o metabolismo do ferro. O sintoma predominante associado a essa condição é a ataxia, caracterizada, nesses casos, por dificuldades na locomoção e na manutenção da postura ereta, reflexos mais lentos, desafios na articulação verbal e perda de sensibilidade nos membros.
E quais são as suas possíveis causas?
- Lesões cerebrais, como tumores, acidentes vasculares encefálicos (“derrames”), traumatismo craniano e infecções.
- Deficiência de vitaminas (B1, B12 ou E). Exposição a certos medicamentos ou toxinas (Fenitoína, Carbamazepina, Fenobarbital, medicamentos sedativos, Lítio, Amiodarona, Álcool, etc.).
- Doenças autoimunes (Esclerose Múltipla, resposta imunológica a tumores, vasculites ou Doença Celíaca).
- Doenças metabólicas, como disfunção da Tireoide ou alterações nos níveis de açúcar no sangue.
- Doenças neurodegenerativas (Atrofia de Múltiplos Sistemas, Ataxias Espinocerebelares).
- Doenças genéticas, como a doença de Machado Joseph.
O diagnóstico
O diagnóstico da ataxia envolve uma ampla abordagem e depende de vários fatores. O neurologista é o médico capacitado responsável pelo diagnóstico da condição. Para que seja realizado de forma correta, algumas avaliações devem ser feitas, por exemplo:
História Clínica e Exame Físico: Inicialmente, o profissional da saúde responsável realiza uma entrevista detalhada para compreender os sintomas, a duração, frequência, grau de comprometimento, entre outros aspectos. O exame físico costuma ser conduzido em seguida para analisar o grau de coordenação, equilíbrio, reflexos e força muscular do paciente.
Exames Neurológicos: Testes neurológicos específicos podem ser realizados para avaliar a função cerebral, nervos periféricos e sistema nervoso central.
Exames de Imagem: A ressonância magnética (RM) e a tomografia computadorizada (TC) do cérebro e, em alguns casos, da medula espinhal são exames importantes na detecção de possíveis anormalidades estruturais e outras disfunções que precisam ser visualizadas por meio dessa técnica.
Exames de Sangue: Exames de sangue fornecem uma série de informações sobre causas metabólicas, genéticas ou infecciosas da ataxia.
Exames Genéticos e Histórico Familiar: Tendo em vista que a influência genérica é muito relevante em alguns quadros de ataxia, os testes genéticos são uteis na identificação das causas hereditárias associadas a cada caso. A avaliação do histórico familiar do paciente que enfrenta condições neurológicas pode ser útil para determinar se há uma predisposição genética, e auxiliar na identificação específica do caso.
Testes de Condução Nervosa e Eletromiografia: Os Testes de Condução Nervosa e a Eletromiografia são procedimentos utilizados para avaliar a função dos nervos periféricos, músculos e a comunicação entre eles.
Líquido Cefalorraquidiano (LCR): A punção lombar pode ser realizada para analisar o líquido cefalorraquidiano, que envolve o cérebro e a medula espinhal, em busca de sinais de infecção, inflamação ou outras anormalidades. Em relação à ataxia, o exame do LCR pode ser solicitado como parte da investigação diagnóstica para descartar possíveis causas infecciosas, inflamatórias ou outras anormalidades que possam estar contribuindo para os sintomas. A análise do LCR pode revelar a presença de células inflamatórias, proteínas anormais, ou indicadores de infecções, entre outros marcadores que podem fornecer pistas sobre a causa subjacente da ataxia.
Tratamento para ataxia
O tratamento da ataxia depende da causa subjacente da condição. Como a ataxia pode ser um sintoma de várias doenças diferentes, o tratamento varia de acordo com a doença específica identificada. Algumas abordagens gerais e estratégias terapêuticas podem incluir:
Tratamento da Causa Subjacente: Se a ataxia for secundária a uma condição médica específica, como uma infecção, distúrbio genético, tumor ou doença autoimune, o tratamento será direcionado à causa subjacente.
Reabilitação e Fisioterapia: A fisioterapia é fundamental para melhorar a coordenação motora, o equilíbrio e a força muscular. Um fisioterapeuta pode criar um programa personalizado para ajudar a melhorar a função motora.
Terapia Ocupacional: Terapeutas ocupacionais podem fornecer estratégias para realizar atividades diárias, adaptando-as conforme necessário para melhorar a independência e a qualidade de vida.
Medicamentos: Em alguns casos, medicamentos podem ser prescritos para aliviar sintomas específicos, como espasticidade, tremores ou dor. No entanto, nem sempre existem medicamentos específicos para tratar a ataxia em si. A prescrição de fármacos depende das variáveis envolvidas em cada caso e envolve a avaliação completa do quadro
Acompanhamento Neurológico: Pacientes com ataxia muitas vezes requerem acompanhamento regular com um neurologista para monitorar a progressão da condição e ajustar o plano de tratamento conforme necessário.
Dispositivos de Assistência: Dependendo da intensidade dos sintomas, alguns pacientes requerem equipamentos e dispositivos de assistência, como bengalas, andadores ou órteses, que podem ser recomendados para melhorar a mobilidade e prevenir quedas.
Intervenções Cirúrgicas: Em casos específicos, cirurgias podem ser consideradas, especialmente se a ataxia for causada por uma compressão nervosa ou outra anormalidade estrutural que possa ser corrigida cirurgicamente.
É crucial que o tratamento seja personalizado para atender às necessidades individuais de cada paciente, levando em consideração a causa subjacente da ataxia, a gravidade dos sintomas e a resposta ao tratamento. O gerenciamento da ataxia muitas vezes envolve uma abordagem multidisciplinar, com a colaboração de diferentes profissionais de saúde, incluindo neurologistas, fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais e outros especialistas.
É muito importante estar atento as condições emocionais do paciente acometido pela ataxia. Em alguns casos, a pessoa afetada pode vivenciar uma diminuição em sua capacidade funcional no ambiente de trabalho, o que pode conduzi-la ao isolamento social, à depressão e a outros transtornos psicológicos associados. Adicionalmente, é fundamental proporcionar apoio à família para que possa ter recursos para enfrentar essa demanda.
Luta contra a Ataxia Espinocerebelar
No dia 25 de setembro, é celebrado o Dia da Luta contra a Ataxia Espinocerebelar, data voltada para a promoção de ações que contribuam para a compreensão dos sinais e sintomas da doença pela população.
O potencial medicinal da cannabis e a ataxia
Embora sejam escassos os estudos que investigam a relação direta entre os derivados da cannabis e o progresso do avanço dos sintomas da ataxia, alguns pesquisadores sugerem que os compostos podem ser benéficos aos pacientes.
O potencial terapêutico da cannabis está envolvido na regulação de diversas condições. Há evidências de que a cannabis é capaz de diminuir a dor, melhorar a qualidade do sono, promover o equilíbrio do sistema imunológico, além de suas propriedades neuroprotetoras e ansiolíticas. Todas essas questões são enfrentadas por pacientes que lidam com quadros de ataxia, o que sugere que o uso medicinal da planta pode acarretar benefícios em diversas esferas.
Mais especificamente quanto ao equilíbrio e a coordenação motora, estudos apontam que os compostos regulam os receptores endocanabinoides presentes no nosso cerebelo, e podem promover a melhora dos quadros e reduzir a progressão da doença.
Todo esse mecanismo é possível graças ao nosso sistema endocanabinoide, que é como chamamos o conjunto de receptores encontrados no corpo humano, capazes de interagir diretamente com os fitocanabinoides, as substâncias presentes na cannabis.
Referências